sábado, setembro 29, 2007

“Tu, homem de Deus”... quando a palavra nos (in)quieta

A propósito da Palavra deste Domingo:


Da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo a Timóteo (1 Tim 6,11-16)

Tu, homem de Deus, pratica a justiça e a piedade, a fé e a caridade, a perseverança e a mansidão. Combate o bom combate da fé, conquista a vida eterna, para a qual foste chamado e sobre a qual fizeste tão bela profissão de fé perante numerosas testemunhas. Ordeno-te na presença de Deus, que dá a vida a todas as coisas, e de Cristo Jesus, que deu testemunho da verdade diante de Pôncio Pilatos: guarda este mandamento sem mancha e acima de toda a censura, até à aparição de Nosso Senhor Jesus Cristo, a qual manifestará a seu tempo o venturoso e único soberano, Rei dos reis e Senhor dos senhores, o único que possui a imortalidade e habita uma luz inacessível, que nenhum homem viu nem pode ver. A Ele a honra e o poder eterno. Ámen.

Na voragem do tempo,
mergulhado muitas vezes em tantos afazeres,
venho a Ti...


Sou um buscador do eterno,
às vezes com medo, outras confuso
e quantas outras em que sou peregrino na noite
como sentinela que procura a aurora
caminhando no meio da confusão e da angústia do tempo presente.
Chamam-me homem de Deus!

Alguns esperam de mim tantas coisa,
Muitos outros esperam que faça, que saiba, que diga…
Estes muitas vezes pensam que o homem de Deus
é um fazedor de coisas, isto é,
alguém que esquizofrenicamente corre de lado para lado
sem nunca se encontrar.

Outros há que me questionam com a sua (aparente) indiferença
E eu, como criança que mal sabe medir os passos,
Recomeço sempre,
Com a mesma alegria e gratuidade
e com a tenacidade de quem sabe
Que “só Tu és o caminho e a força”
Pois sinto que deve ser assim o Homem de Deus.

Também há outros que comungam comigo
da mesma vida que me vem de Ti
e deste ousadia de ser!

Há muitos que me desafiam quotidianamente
a ser em Ti, a ser contigo.
Esses apenas esperam de mim
que partilhe o dom da fidelidade,
da simplicidade e da alegria
e desafiam-me a ser
semeador da esperança que não tem ocaso,
do amor que não tem medida,
da Vida que não tem fim.

Para Eles o homem de Deus
é o que lhes dá Deus!
O que parte e reparte com eles o Pão da Vida
e que celebra em cada recomeço o dom da misericórdia do Pai.

E Tu,
que me chamaste a ser Homem de Deus,
Nunca deixes de me sustentar e nutrir com o Teu amor,
Pois sem Ti nada sou…

Na hora da dúvida
sê a minha paz,
Na hora da confiança
ensina-me a prostrar-me e a adorar-Te,
Na hora das trevas faz-me ver as estrelas na noite
E lembra-me que elas são sempre o prenúncio do dia.

quarta-feira, setembro 26, 2007

indeciso?...

Uma vez mais a Mafalda...
Quantas vezes a nossa vida não é conduzida pela "doce indecisão" vamos caminhando sem saber para onde, com quem,..mas vamos! Num tempo às vezes tão frágil, demagógico e incoerente há que ousar, não ter medo...
Para mim só há um remédio para a indecisão: a ORAÇÃO, é dela que brota a convicção. Nasce aqui também a acção, que assim não é a mera agitação de quem tem muitas coisas para fazer, mas antes o tornar real aquilo que Deus, em Jesus, pela força do Espírito me segredou ao coração.
Por isso, na ousadia de quem se faz peregrino, e como dizia S. Mello Breyner, diariamente "em cada gesto ponho solenidade e risco!".

Parabéns Alex

Senhor Jesus,
Fonte de Vida e nossa Paz,
hoje trago à Tua presença
este teu irmão
que na simplicidade de todos os dias
vai tentando perceber que rumos são os Teus...
Faz Senhor com que ele Te sinta sempre presente no meio das dificuldades,
ensina-o a procurar-Te no meio das dúvidas,
e quando vier o medo,
envolve-o com teus braços e faz-lhe experimentar
a alegria de ser Teu filho.

segunda-feira, setembro 17, 2007

medo do futuro?...



Uma miúda traquina como a Mafaldinha pode ensinar-nos muitas coisas...Sobretudo a não ter medo do futuro!
Este foi também o desafio lançado pelo Papa Bento XVI aos Jovens em Loreto
(Na Vigília 01 Setembro):

«hoje, infelizmente, com frequência uma existência plena e feliz é vista por muitos jovens como um sonho difícil e, em alguns momentos, quase irrealizável.Muitos dos seus conterrâneos vêem o futuro com apreensão e se questionam muito».Eles perguntam-se , dizendo «como integrar-se numa sociedade caracterizada por muitas e graves injustiças e sofrimentos? Como reagir diante do egoísmo e da violência que às vezes parecem prevalecer? Como dar um sentido à vida?». Não tenham medo, Cristo pode preencher as aspirações mais íntimas do seu coração! Podem existir sonhos irrealizáveis quando são suscitados e cultivados no coração pelo Espírito de Deus?». Deixem que eu lhes repita nesta tarde: cada um de vocês, se estiver unido a Cristo, pode fazer grandes coisas». Por este motivo, queridos amigos, vocês não devem ter medo de sonhar, com os olhos abertos, com grandes projectos de bem, e não têm que se desanimar pelas dificuldades.»
Na Eucaristia (Domingo 02 Set.)

"Não sigam o caminho do orgulho, mas aquele da humildade". Andem contra-corrente; não dêem ouvidos a vozes interesseiras que propõem modelos de arrogância e violência, prepotência e sucesso a todo custo, exibição e acúmulo de bens. Sejam atentos e críticos. Não tenham medo de optar pelo caminho do amor verdadeiro. Tenham um estilo de vida sóbrio e solidário, relações afectivas sinceras e puras, empenho honesto no estudo e no trabalho, e profundo interesse pelo bem comum.
Não podemos dizer que somos discípulos de Jesus, se não amarmos e seguirmos a sua Igreja. A Igreja é a nossa família, que nos faz experimentar a vida futura, iluminada pelo Amor. Sentir-se Igreja é vocação à santidade, é empenho de construir a comunhão e a unidade, superando toda resistência e incompreensão. Na Igreja aprendemos a acolher o próximo, os pobres, os últimos."
Um grande e belo desafio este para quem procura olhar e viver o futuro mergulhado na esperança do evangelho! e tu, como olhas o futuro?


domingo, setembro 16, 2007

99=1...a lógica de Deus que é Misericórdia

Uma partilha do meu encontro com a Palavra de Deus neste Domingo:

Na irreverência dos trilhos mal andados
chego a Ti cheio de mim
e quero partir p'ra longe...
longe de Ti e dos Teus,
longe de mim mesmo,
longe das páginas que a vida foi escrevendo
no livro desta história que sou eu.

Com o orgulho da amargura
faço-me à estrada
e caminho pela vereda do incerto.

E Tu, Pai,
despossuído de Ti,
deixando em Tua casa para fazer festa 99 justos
sais como louco pelas veredas do incerto,
caminhas procurando na noite o meu abismo de escuridão,
inquieto,
já não consegues ver os trilhos das veredas que amargamente degustei
pois choras Tu o meu pecado, o meu orgulho,
e vives angustiado por não saberes de mim,
onde estou, o que me falta....
e no meio dos trilhos do incerto,
depois de uma demanda triste e solitária,
deixo-me reencontrar por Ti.

O Todo-misericordioso
acolhe agora a miséria,
e eu, fatigado da canseira,
digo-te:

Pai,
eu não sou digno de ser chamado Teu filho
por todas as vezes em que me conformei com a injustiça,
em que me calei para não anunciar a verdade,
em que me comparei com os outros achando que era mais e melhor,
por todas as vezes em que vi no outro um inimigo e não o rosto de um filho Teu,
por tudo isto,
Pai, também eu, hoje, não sou digno de ser chamado Teu Filho...
E no entanto tu me cercas e envolves,
e como outrora ao pródigo
me repetes:
‘Trazei depressa a melhor túnica e vesti-lha.
Ponde-lhe um anel no dedo e sandálias nos pés.
Trazei o vitelo gordo e matai-o.
Comamos e festejemos,porque este meu filho estava morto e voltou à vida,
estava perdido e foi reencontrado’.

sábado, setembro 15, 2007

Qual é o problema?...

1-Qual a tua opinião sobre os padres católicos casados de rito oriental?
2-Qual é o problema de coexistirem no Ocidente padres celibatários e padres casados?...

São estas as questões que um anónimo preocupado com a temática me deixou, apesar do anonimato(!) naturalmente responderei a estas questões, mas antes há algumas coisas que gostava de dizer:

A reflexão que se pode ou deve fazer sobre a questão do celibato não deve ser vista com um instrumento de batalha entre os que acham que devia acabar ou ser opcional e aqueles que o defendem com o mesmo fervor que os anteriores, mas antes deve merecer de todos uma amadurecida reflexão e oração. Não estamos a tratar de banalidades. Estamos a falar de vidas que se entregam. De um projecto de vida acolhido, rezado, assumido...Seria bom que se perdesse a lógica do ataque vs contra-ataque e todos fossemos capazes de serenamente acolher e ouvir os que discordam e, naturalmente, celebrar também o dom de todos aqueles que continuam a abraçar uma vida que incluí também esta dimensão. Os aspectos que partilhei no último post sobre esta temática centram-se aqui, neste diálogo franco e aberto, onde ninguém é excluído ou excluí.
Há um aspecto no entanto que gostava de incluir aqui hoje e coloco-o sem recriminar ou olhando os outros de cima para baixo, faço-o por uma questão de honestidade de consciência:
quando algumas vezes são publicitados alguns casos de padres que abandonaram o ministério tenho ouvido, quer da comunicação social quer de alguns cristãos, quer dos próprios, colocar sempre a tónica na questão do celibato, aliás é isso que habitualmente faz título na noticia. Contudo quando leio mais atentamente aquilo que os próprios dizem vejo que a razão de fundo para esta "partida" não é o celibato mas sim uma vida de oração desorganizada, um activismo frenético que faz com que se fale muito de Deus mas pouco com Ele, o desejo de uma Igreja e de um Evangelho à medida do que lhes convém e não segundo a medida de Cristo (profundidade/convicção, liberdade, alegria). é por isso que julgo muito conveniente quando falamos do celibato dos padres (ou do fim dele) perguntarmo-nos (e perguntar-lhes) também (e os cristãos têm esse direito) como vai a vida de oração, a sua pobreza (embora não façam um voto), como vai a sua obediência (que outra coisa não é se não a disponibilidade para caminhar com outros partilhando alegrias e dificuldades), como vai a sua comunhão com as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens e mulheres do nosso tempo. é que o celibato não é uma "moldura decorativa" do ministério presbiteral, ele é um dos muitos aspectos daquilo que constitui a vida de um padre, e são esses muitos que fazem a unidade, quando um vai mal todos os outros vão atrás...
Nos breves anos que levo de ministério presbiteral, os que me conhecem sabem que sou profundamente Feliz! Feliz por acreditar em Deus, por ter acolhido o seu convite a ser padre, Sou feliz no celibato que abracei neste projecto de vida e por poder partilhar este dom com todos os meus irmãos baptizados. Feliz por poder ser para crentes e não crentes uma presença acolhedora e misericordiosa e um sinal da ternura e alegria deste Deus "loucamente apaixonado por aqueles que criou à sua imagem e semelhança". Sou feliz por ser Padre e por me sentir irmão de todos e de cada um daqueles e daquelas que fazem parte do Povo Santo de Deus.
Quantos às questões deixadas:
1- A minha opinião sobre os padres católicos casados de rito oriental é a seguinte: são tão padres quanto eu que procuram certamente ser com a vida um sinal de Cristo, o Bom Pastor, e que pelo ministério que a Igreja lhes confiou vão procurando semear no coração dos homens e mulheres do nosso tempo a Boa Nova de Jesus Cristo, Morto e Ressucitado.
2-Qual é o problema de coexistirem no Ocidente padres celibatários e padres casados?
Não vejo problema nenhum. Aliás eles já coexistem. Conheço dois desses padres casados com quem já conversei longamente (também sobre a questão do celibato, que eles próprios colocaram). A Igreja Católica de rito Oriental não é uma igreja de "segunda classe" nem os seus padres são "sacristães promovidos a padres". São parte da mesma Igreja Una, Santa, Católica e Apostólica da qual faço parte pelo baptismo. São para mim uma riqueza extraordinária que devemos acolher, acarinhar, conhecer.

segunda-feira, setembro 10, 2007

Uma questão de fidelidade...

Vou procurar ao longos destes dias enunciar aqui numa linguagem simples alguns aspectos que penso ser necessário aclarar para que todos nos entendamos honestamente naquilo que dizemos e não criemos confusão "só porque sim!"
1. O celibato é uma das possibilidades, tal como o matrimónio, dada ao cristão para assumir e viver o seu baptismo e a radicalidade do evangelho.
2. O celibato não é uma realidade anarquica, que exista como um fim para si mesmo, ele é um apelo à extroversão, isto é, ao sair de si para se dar plena e totalmente aos outros, é desafio a um amor oblativo, tal como o é qualquer vocação cristã (logo a começar pelo nosso Baptismo!). daí que ao falarmos de celibato falamos sempre de amor, de um amor que, tal como o amor matrimonial, é chamado a dar-se todo a todos. A lógica da ternura, do afecto, é aqui que entra. o celibato não é por isso uma fuga à ternura e o afecto mas é antes um desafio a ser universalmente afectuoso, terno, próximo...
3. o celibato enquanto este "escândalo" para o nosso tempo tem a sua razão de ser na opção radical pelo Absoluto que é Deus. é Ele o ponto de partida e de chegada. E só porque se faz esta opção fundamental por Deus é que depois podemos deduzir daí a disponibilidade, a proximidade,...é por isso que ser celibatário não significa ser mais ou menos cristão, significa tão somente ter feito uma opção...e vivê-la!
4.O celibato não faz parte do nosso credo dominical mas é uma questão de fé. Só na lógica da Fé num "Deus Loucamente enamorado por aqueles que ama" é que se pode entender que tantos homens e mulheres (e note-se que não estou só a falar de padres!) ao longo destes 2000 anos continuem a abraçar esta opção como um dom e um sinal, para cada tempo, de que só Deus basta.
5.Ser celibatário é exigente não porque implique apenas e só contenção sexual (como alguns tanto gostam de sublinhar) mas porque é um apelo a viver um projecto de fidelidade que se renova todos os dias. e o que vale para um cristão celibatário vale igualmente para um cristão casado ou para um cristão em discernimento da sua vocação. A fidelidade só é verdadeiramente feliz quando se descobre peregrina, isto é, a fazer caminho...e a fidelidade para um cristão baptizado é isso mesmo, é fazer caminho, é recomeçar todos os dias como se fosse o primeiro, o único e o último.
Estes aspectos que procurei apresentar aqui numa linguagem muito simples (e outros que ficam por enumerar) não coincidem naturalmente com a lógica mercantil como alguns entendem a vocação cristã (os do "se assim fosse havia mais padres") nem lhes servem como ponto de partida para a reflexão.
No tempo em que vivemos, e que é um tempo bom apesar das muitas fragilidades que todos experimentamos ou criticamos, julgo não ser tempo para cruzar os braços e irmos pelo caminho mais fácil...a exigência da profundidade sempre fez parte do projecto de Jesus e do projecto que Ele nos deixou. Há naturalmente alguns escândalos, infidelidades,dificuldades, negá-los seria desonesto! Em muitas dioceses do mundo é também verdade que diminuiu o nº de vocações...mas a dificuldade é motivo para mudar tudo ou um tempo para aprofundar mais? Quem me conhece sabe que não gosto de soluções fáceis...mais do que padres, faltam à Igreja cristãos comprometidos...talvez porque nós padres andemos ocupados e distraídos com muita coisa que não é essencial.

sexta-feira, setembro 07, 2007

a propósito da inquietude...

Tenho reparado neste recomeçar uma certa inquietude que domina alguns acerca do celibato em muitos espaços na blogoesfera.

Há como que uma determinação hostil (que me parece não ser honesta) na forma como se coloca a questão. Ao longo dos próximos dias partilharei convosco aquilo que penso.
Procurarei fazê-lo não para ser polémico (olhando o que se diz e escreve como quem vê as coisas da varanda e apenas lança mais barulho para a confusão) mas a partir da minha experiência pessoal crente, livre e feliz do ministério presbiteral que a Igreja me concedeu e confiou e que eu responsavelmente vou procurando viver em cada dia.

Faço-o na convicção da fé pois, como dizia um dos meus mestres, é preciso distinguir para não confundir...e parece-me que a questão acerca do celibato não pode ser abordada como uma questão de consensos, democracias ou, se preferirem numa linguagem mais simples, uma questão do "a alguns dava jeito" ou "assim teriamos mais padres"...ou pior ainda "assim a Igreja era mais fiel ao projecto de Deus".

A seriedade e serenidade que nos merece a questão deve suscitar também a humildade e honestidade da reflexão.

re-começar...


No silêncio do tempo, e habitado agora pela paz de quem repousou em Deus, com Ele e n'Ele, regresso com a determinação de uma inquietude que se renovou na fidelidade, na alegria da partilha do caminho, na contemplação de muitos que já não via há algum tempo...


Recomeçar é próprio de quem parou para se avaliar, de quem se deixou olhar sem medo pelo Deus Fiel e Santo e se sentiu interpelado a ousar, a propor, a permanecer.


recomeço com a determinação humilde de quem sabe que a vida se faz de passos pequenos, mas com a certeza que nasce da confiança crente de que é a determinação do primeiro passo que marca o ritmo do caminho.


eis-me aqui!